23 O Quinto Andar

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O Quinto Andar


A ida para o quinto andar me assustou, não só pelo tamanho e pela disposição, mas por saber que eu seria apenas mais um naquele universo de lesados medulares que menoscabam o destino. E isso era o que mais me amedrontava. 
O andar estava dividido em duas alas: uma masculina e a outra, feminina. Eu soube logo ao chegar que, por terem normalmente mulheres acompanhando os pacientes dos quartos, nossas atividades diárias deveriam ser feitas na ala feminina.
O que separava as duas alas, conferindo mais privacidade para cada uma, era um corredor cumprido cercado de janelões arredondados de concreto e vidro, dispostos lado a lado. Nessa área, aparentemente desperdiçada, ao longo do trecho médio do corredor, ficavam as suítes para que aqueles pacientes mais dependentes de maiores cuidados e mais atenções pudessem ficar com seus familiares. Um deles estava reservado para mim. 
Quando entrei, a primeira coisa que fiz foi observar o banheiro em seu espaço e se era bem adaptado para cadeirantes. Depois fui esquadrinhando o quarto, vendo um armário embutido, um sofá-cama fazendo as vezes da cama de companhia, um criado mudo nos moldes adotados pelo padrão do hospital. 
Havia um espaço confortável para minha maca e minha cadeira de rodas. Ao fundo do quarto, por entre a cortina meio aberta, logo notei uma porta de vidro, para onde pedi para rumar. A porta de vidro, oposta à porta de entrada do quarto, se abria para um outro espaço. 
Era uma área aberta e com vistas para o céu e para a vizinhança do hospital, com um pequeno jardim disposto em cada um dos cantos. Uma pequena brisa mais fresca começava a se lançar naquele final de tarde sobre esse terraço. Um paciente quedava em sua maca aproveitando a ocasião ao lado de sua esposa. 
Fui observando que, conquanto a capacidade para cinco pacientes e seus familiares, um quarto estava totalmente ocupado por aparelhos e equipamentos para a fisioterapia. Aquela área privativa dos quartos era um espaço para aproximação entre os ocupantes, para tentar criar mais laços de amizade e de solidariedade: um cuidava do outro.
O tempo foi passando e tudo o que se referia ao Primeiro Estágio foi aos poucos perdendo espaço para a rotina do quinto andar. Aquele temor e aquela insegurança iniciais foram se esvaindo à medida que eu ia criando novos laços com os outros iguais. 
Ali pude ter mais tempo para conviver com a minha família e com a realidade dura de uma nova realidade e ter também mais espaço de liberdade para receber visitas, quando elas vinham. Enquanto isso, eu ia aprendendo com cada um ali, com seus familiares e com as outras pessoas que nos cercavam.
O final de ano chegou e eu tive a notícia: teria que passar as festas de final de ano em casa.
“Ai, que medo!”, pensei.

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