19 A Casca de Tartaruga

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A Casca de Tartaruga


Não demorou muito a casca de tartaruga estava pronta.
Toda transparente. Por fora, podia ver meu peitoral todo pressionado dentro daquela redoma de acrílico grosso. Por dentro, existia um vão entre meu peito e o teto interno daquela carapaça para que meu peito e minha barriga pudessem se movimentar com o processo de expansão com a ventilação e aspiração. 
Na borda de toda base, uma borracha grossa foi fixada para conferir maior conforto e realizar uma pressão negativa, quase formando um vácuo.  Na parte superior externa, fora feito um orifício para passar um cano estreito com uma espécie de válvula na ponta, onde se prenderia o conector do aparelho ventilador-aspirador. Por cima da casca, duas fitas grossas colocadas em paralelo proporcionavam maior pressão e aderência da casca em peito.
Só faltava o teste.
Tudo pronto e todos a postos, o teste começou.
A carapaça trouxe realmente maior resultado para o processo. Com toda aquela pressão, eu sentia forçar meu tórax e meus pulmões inflarem verdadeiramente. Com o orifício livre da traqueostomia sem o conector do respirador, o ar entrava e saía naturalmente. Durante esse processo, eu ia complementando-o com o movimento sincronizado de ombros para cima e para baixo.
Todos os que acompanhavam o teste se detinham a vários detalhes em análise. Após pouco tempo de funcionamento, passaram a me auscultar também. E pelos olhares e pela expressão, tudo parecia correr conforme o esperado. Só faltava o teste de gasometria, para se confirmar as expectativas que não tardou em ser feito e se obter o resultado.
A casca permitia a manutenção dos níveis de oxigenação desejados. A princípio, estava dando certo, necessitando, no entanto, novos exames de verificação da gasometria a cada espaço de tempo a fim de se constatar a permanência desses níveis. E assim foi feito.
Tudo certo. Com essa resposta, tinha que ir aumentando o tempo de permanência desse novo método de respiração. O que no início começou com minutos passou-se a ficar horas, sempre presente nesse estágio o fisioterapeuta. A fisioterapia sempre dava o reforço em exercício. E assim ocorreu.
Após uns dias de respostas positivas, a casca de tartaruga e eu fomos objeto de uma série de fotografias e imagens. De um bocado de anotações. De uma onda de visitas investigativas e reuniões de análises clínicas. 
Nesse contexto, eu estava novamente contente em retomar o centro das atenções, inclusive aparecendo em trailer oficial prévio dos filmes apresentados em sessão de cinema no hospital. Todavia, a pretensão era apontar tudo o quanto fosse do caso para, quem sabia, divulgar no meio científico e obter respostas e mais ideias.     
Ao lado dessas questões, uma situação nova e curiosa começou a se desencadear: imperceptivelmente, o forçar a respirar por esse aparelho novo fez com que inesperadamente estimulasse o nervo vago, conhecido também por nervo do diafragma. 
Essa nova situação fez com que motivasse a retomada da minha respiração, fazendo com que eu voltasse novamente a respiração autônoma, longe dos aparelhos. Como que uma centelha divina reacendesse meu processo respiratório independente.
Deus escutou minhas preces...
            

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